Nos Transportes Urbanos de Braga, este mês, pode-se ler:
o amoral da história
o suor do lavrador faz brotar semente
a semente do lavrador faz brotar suor
na goma da camisa está a importância da cerimónia
na graça da criança está a desculpa para o adulto
a raiva acumulada dá o álibi ao pretexto
perder a razão é comum em momentos de crise
saber estar é circunstancial
viver bem despoleta invejas
voltemos atrás vivamos mal ou finjamos viver mal
estar fora da realidade é a solução para quando a realidade não serve
o que nos serve de lição pode ficar curto nas mangas a outro
um companheiro deve ser um amigo ou pelo menos não ser um inimigo
a verdade é a nossa
ao longo da vida existem momentos em que escolhemos e outros que escolhem para nós
criar é um privilégio
criar é um dever
criar é uma obrigação
criar é
criar pode ser
criar às vezes não é uma característica
dar mérito a quem não o tem é perigoso
dar mérito a quem o tem é difícil
saber o nosso lugar é uma fonte de consumições
não ter lugar pode ser a liberdade
não ter onde ficar é desconfortável
viver na escuridão faz mal aos olhos
olhar para o sol directamente também
roubar é errado
roubar está errado
a gravidade de um roubo depende do que roubamos
de a quem roubamos
de quando roubamos
de como roubamos
de porque roubamos
de se hesitamos antes e se dormimos bem depois
da falta que faz o que foi roubado a quem foi roubado
e da falta que vai fazer a quem rouba
a circunstância de passar a fazer parte do conjunto de pessoas que já roubaram poderá ser também factor de adversidade ou não
a inteligência não anda de mãos dadas com o sucesso para não cair
todos temos um objectivo
uns sabem-no
outros não
há gente que descobre quando já é tarde demais
há gente que sabe que já é tarde demais quando descobre
há gente que sabe mas que não quer descobrir
e há gente que descobre mas que não quer saber
levar um dia de cada vez pode criar-nos dificuldades em fazer planos para o fim-de-semana
estar sempre de pé atrás pode obrigar-nos a coxear
se formos cruéis para os nossos semelhantes os nossos semelhantes serão iguais
se tivermos vergonha das nossas origens vamos ter menos anos de vida
a comunicação é muito importante
falar é importante
falar é mais importante do que falar alto
falar é mais importante do que falar baixo
tocar é muito mais importante do que falar
correr sem sentido às vezes é tão útil como saber para onde se corre sempre
começar bem um projecto ou viagem é melhor que um mau começo mas quase tudo está acometido de reversibilidade
e quase nada está acometido de irreversibilidade
estar atento ao que se passa é muito útil mas pode dar-nos demasiada consciência da nossa impotência
estar apenas atento faz-nos
amorfos
apolíticos
amorais
amáveis
o estado de atenção deverá ser alimentado por uma constante e genuína vontade de intervir
essa vontade de intervir deverá ser secundada pela intervenção em si
quem quiser viver mais tempo deve evitar confusões
quem quiser viver deve meter-se nelas
fazer o que nos mandam é mau
fazer o que nos pedem pode ser bom
quem só manda é mau
quem só pede quer ser mas não consegue
os desafios servem para falhar
os desafios servem para conseguir
a coragem mede-se com uma régua imaginária que só existe quando o coração bate forte
a boca fica seca e sentimos o desmaio eminente
os heróis são homens
as guerras servem para vender armas a santos
a simplicidade é difícil de atingir só porque ninguém é simples
ninguém quer ser simples
as crianças fazem de conta que não sabem para que os pais se sintam melhor
para que os pais sintam melhor
para que os pais se sintam melhores
os significados são exclusivos de quem os compreende
as relações entre pessoas são a causa principal de grande parte das coisas boas
as relações entre pessoas são a causa principal de grande parte das coisas más
o amor não é uma invenção
se o amor fosse uma invenção funcionava
as histórias não deveriam ter moral
as histórias deveriam ter mensagem
esta história não é uma história
o fim obriga-nos sempre a parar
[e porque no somatório dos dias que se perdem, existem sempre dois alimentos obrigatórios: o pão e a palavra... do bolo do trigo e centeio, já o homem esqueceu o seu sabor; da fogaça da palavra, verte a sombra daquele que procura na letra, a construção primordial - o mundo [pequena peça para montar e desmontar, qual puzzle de nada e coisa nenhuma, tudo enfim] - e funciona!]
ResponderEliminarum imenso abraço deste lado do quintal
Leonardo B.
Pois é! E romã é amor [à sombra...
ResponderEliminarEste poema diz muita coisa muito importante, deviam ser cem poemas!
ResponderEliminarCada duas frases são poemas, aliás eu ia mais longe e arrisco que há frases que por si só são poemas...
esta parte mexe especialmente comigo
"todos temos um objectivo
uns sabem-no
outros não
há gente que descobre quando já é tarde demais
há gente que sabe que já é tarde demais quando descobre
há gente que sabe mas que não quer descobrir
e há gente que descobre mas que não quer saber"
todos mexem mas esta fica a moer na cabeça, a moer a essência...
é mesmo assim a tua escrita, já li algures no teu blog alguém a dizer que a tua escrita foi feita para nos fazer crescer, amadurecer, e é mesmo isso! Esta frase dá muito que moer!
=)
quantas verdades nas palavras certas, no trocadilho das sintaxes, na desconstrução do óbvio. joão tens muito mérito e sabes disso. ser diferente é um must. abraço grande.
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