inclui poema vencedor do Prémio Nuno Júdice 2009
o Outono visto pela janela
na casa onde nasci havia sons e cheiros meus
as pessoas que os tinham emprestavam-mos à memória
e eu incluía-os como amigos íntimos
nesta não tem gente
ou se tem não têm cheiro
nem som porque eu não me lembro
gastei toda a memória nas pessoas antigas
e o espaço para as novas é um T1 que fica muito para além do T
onde eu estou sem visitas
fechado à medida de não deixar entrar
preciso do que já foi como do próximo ar para me lembrar que foi bom
eu já fui bom
agora não sei
mas já fui
juro que fui
e quero gastar as únicas energias a fazer manutenção às memórias
p’ra que nenhuma se perca
era pena
é que até a gente que me fez por dentro como a um cofre já não existe
e quero mantê-los ligados à máquina para sempre
e a máquina sou eu
e para sempre sou eu
anda
aconchega-te no mofo do T1
finge que és de antigamente para te dar os beijinhos de quando era pequenino
cheiras à minha avó
à roupa no estendal
à canção do fim dos bonecos
ao banho que está a ficar frio
ao grito do granizo do dia mais longo em que a casa esteve para cair
tu cheiras e sabes ao dia em que a casa esteve para cair
que foi no mesmo dia em que resistiu
como se estivesse ali desde o início dos tempos
e os tivesse começado para eu os acabar
acabar
acabar
acaba comigo que me falha a lembrança
e restas-me como a folha que esteve para cair
e que só não caiu porque o mundo acabou antes do Outono
in a verdade dói e pode estar errada
adorei o titulo :D
ResponderEliminarboa sorte!!
uauuuu!!! Parabéns mais uma vez João! Quanto mais leio, mais me apaixono pelo teu trabalho! Algum livro será publicado no Brasil?
ResponderEliminarAbraço
uma poesia de subtileza confessional que vai para além da memória; um prédio de muitos andares dentro de um T1. Gostei muito.
ResponderEliminarMuito bom. O texto, toca, comove, embriaga e apaixona :)...continuação de muitos mais novos trabalhos que nos alimentem o interior.
ResponderEliminarUm abraço.
Sandra
Lindo!
ResponderEliminarMais um que vai para a estante e vai ser devorado por mim.
ResponderEliminarBeijinho e saudades
...e assim te vou descobrindo...e cada vez mais me surpreendo e encanto.
ResponderEliminarObrigada
maria teodoro
Como fazer entrar num alojamento dum homem – os dois modernos – a sinfonia e a biblioteca dos pensamentos da sua adolescência. Os muros não são os mesmos, nem o telhado, nem a perspectiva do apoio para o grande salto da crua vida social. Os cheiros, os gritos, as advertências e a culpa dos ramos que não podem entrar pelas aberturas que cheiram a tinta de reclame. A náusea do boneco inserido numa realidade tão fria, que as palmadas no traseiro deixam tantas saudades. O introspectivo que questiona o objectivo sobre a natureza da relação – ante-pós- Acho interessante trazer para a poesia este tema bem trabalhado e sem pretensões que não sejam o da escrita poética. Parabéns João. Não me enganei na minha primeira abordagem à tua poesia. Se já não és, serás dos grandes ainda em vida. Não te mates... a literatura criada assim não deixa o autor no poço, se tal acontecer ele tem a chave da salvação... escrever. abração.
ResponderEliminarJoâo, noto que foste publicado ou honrado pela Flip de Paraty da amiga Liz Calder. Eu mesmo em 2005 tive uma pequena actuação nesse festival embora não a nivel de programação. Estive todo o tempo naquela localidade. Gostei sem gostar, pois um pouco muito elitista, mas é um grande momento literário no Brasil.
ResponderEliminarBelo, Belo e Belo... que mais se pode dizer se não?
ResponderEliminarPAR_TO
soltas versos com dureza e com verdade e ainda reconheces poder estar errado.
ResponderEliminaré assim a sabedoria do mundo! simples e imensa mas cabendo na palma de uma mão.
basta, para tal, ler a sina nessas linhas com que escreves.